1 João
(1 Jo)
Primeira Epístola de João
Autoria – João, o apóstolo. Seu nome não é mencionado em suas
três epístolas. Não obstante, sua autoria foi confirmada por Policarpo,
Papias, Eusébio, Irineu, Clemente de Alexandria e Tertuliano. O nome
"João" significa "graça de Deus". Era judeu, pescador (Mt.4.21), irmão
de Tiago, filho de Zebedeu e Salomé (Compare Mt.27.56 e Mc.15.40). Foi
chamado de discípulo amado – Jo.13.23; 19.26; 21.20. Foi o discípulo
mais íntimo do Mestre. Até no momento da crucificação, João estava
presente. Isso mostra sua disposição de correr risco de vida para ficar
ao lado de Jesus. Apesar de ter fugido no momento da prisão de Cristo,
João voltou pouco tempo depois.
Jesus chamou João e Tiago de boanerges, "filhos do trovão", referindo-se
ao seu temperamento indócil, tempestuoso, violento (Mc.3.17; Mc.9.38; Lc.9.54).
São várias as citações a respeito de João nos evangelhos de Mateus,
Marcos e Lucas. Seu nome é omitido no seu evangelho (João 20.2; 19.26;
13.23; 21.2). Encontram-se referências ao apóstolo também em At.4.13;
5.33,40; 8.14; Gl.2.9; 2 Jo.1; 3 Jo.1; Apc.1.1,4,9. Na segunda e na
terceira epístola, ele se apresenta como "o presbítero". Podendo se
apresentar como apóstolo, demonstrou humildade ao utilizar título mais
simples. Em Apocalipse, apresenta-se como "servo".
Após o exercício do seu ministério em Jerusalém, João foi pastor em
Éfeso, onde morreu entre os anos 95 e 100. Policrates (ano 190), bispo
de Éfeso, escreveu: "João, que se reclinara no seio do Senhor, depois de
haver sido uma testemunha e um mestre, dormiu em Éfeso."
Palavras chave: Conhecimento (ou saber) , amor e comunhão.
Data de escrita da primeira epístola – Final do primeiro século,
entre os anos 95 e 100.
Local de origem – Éfeso
Destinatários – Por não conter saudações, despedidas ou menção de
nomes, tem-se considerado que a carta foi destinada à igreja em geral. O
apóstolo trata carinhosamente os destinatários como "meus filhinhos"
(2.1,18,28; 3.7,18; 4.4; 5.21) e "amados" (3.2,21; 4.1,7,11). Isso
parece indicar que, embora não tenha vinculado a epístola a uma
comunidade específica, o autor tem em mente pessoas conhecidas, as quais
seriam as primeiras a receberem aquela mensagem.
CARACTERÍSTICAS
A carta apresenta denúncia contra os falsos e incentivo aos verdadeiros
cristãos. O autor é incisivo, direto, totalmente convicto. Sua
afirmações são muito fortes no sentido de apontar o erro e a verdade.
O propósito da carta está bem definido com também vimos no
evangelho (João 20.31). A epístola foi escrita:
1 - "Para que a nossa alegria seja completa" - 1.4
2 - "Para que não pequeis" - 2.1.
3 - Para advertir contra os enganadores - 2.26.
4 - "Para que saibais que tendes a vida eterna" - 5.13.
Entendemos que o autor estava bastante preocupado com a igreja, em seu
estado presente e futuro. Os demais apóstolos já haviam morrido e falsos
mestres apareciam por toda parte. Alertando os irmãos, o apóstolo
ficaria mais tranqüilo e sua alegria seria completa (1.4). Seu alerta é
contra o pecado (2.1) e contra as heresias (2.26). São duas portas para
o diabo entrar nas vidas e nas igrejas. Embora as duas coisas estejam
intrinsicamente ligadas, as heresias apresentam um elemento muito
perigoso. Todo tipo de pecado deve ser evitado, mas se, eventualmente,
cometermos algum, confessaremos e seremos perdoados (1.7,9; 2.1). A
heresia entretanto, constitui-se num caminho de afastamento de Deus.
A heresia, do tipo mencionado por João, leva à apostasia. Então, tem-se
uma situação muito perniciosa em que a pessoa está errada mas pensa que
está certa. Trata-se de um estado de pecado sem reconhecimento, sem
confissão, sem arrependimento e, consequentemente, sem perdão. Aquele
que passa a crer numa doutrina contrária à cruz, como pode ser perdoado?
Não é que Deus se recuse a perdoá-lo, mas a própria pessoa não acredita
na única solução divina, que é o sacrifício de Cristo. A reversão desse
quadro é possível, mas muito difícil. O melhor é a prevenção contra as
heresias e isso se faz através do conhecimento e apego à Palavra de
Deus.
CENÁRIO OBSERVADO POR JOÃO
A situação da igreja inspirava cuidados. Notamos isso pelo que se lê nas
cartas às sete igreja da Ásia (Apc.2 e 3). As heresias grassavam
em muitas comunidades. Em Apocalipse, livro escrito na mesma época, João
menciona as expressões "sinagoga de Satanás" (Ap.2.9), "nicolaítas"
(Ap2.6,15), "doutrina de Balaão"(Ap.2.14), etc.
O gnosticismo, sistema que mistura idéias filosóficas, crenças
judaicas e cristãs, era uma das principais fontes de heresias da época.
Assim, muitos cristãos se tornaram gnósticos. Criam em Jesus mas negavam
a realidade de sua encarnação e morte. O fato de se denominarem cristãos
criava uma situação confusa. Quem eram os verdadeiros cristãos? Os que
criam de uma forma ou os que criam de outra?
João observou a necessidade de identificação, discernimento, definição e
posicionamento. Observemos as perguntas-chave que autor
apresenta:
1 – "Quem é o mentiroso senão aquele que nega que Jesus é o Cristo?" (I
Jo.2.22).
2 – "Quem é o que vence o mundo senão aquele que crê que Jesus é o Filho
de Deus?" (I Jo.5.5).
O autor se mostra bastante interessado em mostrar "QUEM É O QUÊ". São
usados pronomes demonstrativos e indefinidos para apresentar
especificações bem definidas que permitem identificar os indivíduos em
relação a Cristo. João usa repetidamente a fórmula: "Quem não faz isso
não é aquilo". ou "Quem faz tal coisa é outra coisa".
Aquele - 2.6,11,17,22,23,26,29; 3.4,6,17;
5.1,5,16,18 (Veja também II João 1.9).
Alguém – 2.1,15,27; 4.20; 5.16.
Quem – 4.7,8,9,10.
O mentiroso e o verdadeiro precisam ser identificados. Essa é a missão
de João em sua primeira epístola. O autor ajuda a identificar os
personagens do cenário e a situação dos próprios leitores no contexto da
verdade e da mentira. O exemplo clássico utilizado é o de Caim e Abel (I
Jo.3.11-12), representando dois grupos de pessoas que estavam dentro da
igreja. O autor identifica quem está em comunhão com Deus e quem não
está. No quadro a seguir, listamos diversas expressões da epístola
através das quais se traça uma linha divisória entre os dois grupos.
Vamos chamá-los, alegoricamente, de "grupo de Abel" e "grupo de Caim".
"Grupo
de Abel" |
"Grupo
de Caim" |
Vida (1.1,2; 2.16,25;
3.14,15,16; 5.11,12,13,16,20) |
Morte (3.14; 5.16-17) |
Verdade – 1.6,8; 2.4,5,8,21,27;
3.18,19; 4.6; 5.7,20. |
Mentira – 1.6,10; 2.4,21,22,27;
4.20; 5.10
Erro – 4.6 Engano - 1.8; 2.26;
3.7 |
Verdadeiro (2.8,27; 5.20) |
Falso ou mentiroso (2.22) |
Espírito da verdade (4.6) |
espírito do erro (4.6) |
Cristo (1.3, etc) |
Anticristo (2.18,22) |
Amor ao irmão (2.10) |
Amor ao mundo (2.15) |
Sofre ódio do mundo (3.13) |
Ódio ao irmão (2.11; 3.15) |
Luz - 1.5,7; 2.8,9, 10. |
Trevas – 1.5,6; 2.8,9,11. |
É possível passar de um lado para o outro. Esse trânsito pode ser
chamado conversão ou, no sentido contrário, apostasia.
João disse que "passamos da morte para a vida." (3.14). E o seu cuidado
era para que não acontecesse o processo contrário com alguns irmãos que,
envolvidos pela heresia, pudessem passar da verdade para a mentira.
IDENTIFICANDO A DOUTRINA, O MESTRE E O
ESPÍRITO
A heresia é uma doutrina errada, mas isso pode não estar tão claro no
início. O que chega até nós é simplesmente uma doutrina. Esta deve ser
então identificada. Por meio dos parâmetros encontrados na epístola, o
autor identifica a doutrina, o mestre e o espírito
que está por trás (2.22-23, 4.1-6). As chaves identificadoras são:
● Relação com
Cristo (2.22-23);
● Relação com
os irmãos. (3.10,17).
● Relação com
o mundo (2.15).
Estes são os "instrumentos" que nos farão identificar a verdade e a
mentira. Tais indicadores são complementares entre si. Se alguém negar
que Cristo é o Filho de Deus, estará reprovado. Não está na verdade. Se
alguém afirma que Cristo é o Filho de Deus mas nega sua encarnação e
morte, estará reprovado. Se alguém diz ter uma fé correta a respeito de
Cristo, então o próximo teste é a relação com os irmãos. Se a pessoa
odeia os irmãos ou lhes nega auxílio nas necessidades, então estará
reprovada. Se a pessoa ama o mundo, anda segundo o mundo, vive de modo
agradável ao mundo, pecando habitualmente, então está do lado da
mentira. A relações com os irmãos e com o mundo constituem evidências
visíveis do tipo de relação que temos com Cristo, uma vez que esse
vínculo é espiritual e invisível.
O objetivo dessas colocações não é sairmos julgando as pessoas dentro da
igreja. Em primeiro lugar, cada um deve julgar e purificar a si mesmo (I
Jo.3.3; 5.10; I Cor.11.28,31; II Cor.13.5; II Jo.1.8). Depois, é preciso
que saibamos julgar as profecias e as doutrinas que recebemos (I
Cor.14.29; I Tess.5.20-21; I Cor.10.15). Se uma doutrina é contrária a
Cristo, contrária à comunhão dos irmãos ou favorável ao
mundanismo, então deverá ser rejeitada. Finalmente, a vida de um
mestre deverá ser avaliada para que se decida sobre a sua doutrina.
"Pelos seus frutos os conhecereis." (Mt.7.15-16). Muitos irmãos podem
apresentar uma série de erros e até mesmo pecados por uma questão de
imaturidade, fraqueza, ignorância, etc. Não devem ser alvos de
julgamentos mas de orientação. O objetivo de João era alertar contra
aqueles que se colocavam como mestres da igreja.
ESTAR E PERMANECER - POSIÇÃO E
PERSEVERANÇA
No cenário da verdade e da mentira precisamos nos localizar. Onde
estamos? João usa diversas vezes o verbo "estar". Em algumas
delas, ele se preocupa em "localizar" espiritualmente as pessoas. Se
guardamos a palavra e amamos os irmãos, isso indica que "estamos" em
Cristo. Quem não ama seu irmão, "está" nas trevas. Finalizando, o autor
diz que "estamos" em Cristo, que é o verdadeiro Deus. (I Jo.2.5,6,9;
5.20).
Podemos ter nossa posição muito bem definida. Entretanto, vamos
mantê-la? Um outro verbo muito importante para João é "permanecer".
Lembre-se do capítulo 15 do evangelho de João: "Permanecei em mim e eu
permanecerei em vós". "Se alguém permanece em mim e eu nele, esse dá
muito fruto." "Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora." "Se
vós permanecerdes em mim e as minhas palavras permanecerem em vós
pedireis o que quiserdes e vos será feito." "Permanecei no meu amor...",
etc.
Na primeira epístola, a ênfase continua nos seguintes textos:
2.10,14,17,19,24,27,28; 3.6,9,14,15,17,24; 4.12,13,15,16. Em todos esses
versículos aparece o verbo "permanecer". Isso demonstra a preocupação do
autor com a perseverança dos irmãos no caminho da verdade. (Veja também
II João 1.2,9).
COMBATE AO GNOSTICISMO
João se mostrou bastante combativo em relação ao gnosticismo. Esta
palavra vem do termo grego "gnosis" que significa "conhecimento". Os
gnósticos criam e ensinavam que a salvação da alma dependia do
conhecimento de alguns mistérios só revelados aos que participavam de
seus rituais de iniciação. O apóstolo usou então a mesma palavra,
"conhecimento", para combater as heresias gnósticas. Tanto no evangelho
como na primeira epístola, ele mostrou o que realmente importa conhecer:
A verdade, que é o próprio Cristo e o amor, que é o próprio Deus.
O conhecimento sem amor pode causar tragédias. A bomba atômica é um
exemplo clássico.
O verbo "conhecer" aparece nos seguintes versículos: I Jo.
2.3,13,14,18,20; 3.1,6,16,19,20,24; 4.2,6,7,8,13,16; 5.2.20. (II João
1.1).
A carta destaca também a palavra "luz", que também é um símbolo do
conhecimento: 1.5,7; 2.8,9, 10.
Outro verbo similar é o "saber". Essa palavra tem um sentido muito
forte, pois não admite dúvida, insegurança, medo nem ignorância. O
comentário da Bíblia Thompson chama a primeira epístola de João de "a
carta das certezas". O autor usa o verbo "saber" de uma forma bastante
clara e determinada. (I Jo.2.3,5,11,21,29; 3.2,5,14,15; 5.15). Ele diz:
"Sabemos que somos de Deus." Não estamos perdidos nem confusos. SABEMOS
quem somos, onde estamos e para onde vamos.
O gnosticismo afirmava que o mal residia na matéria. Portanto, negavam
que Deus pudesse se encarnar. Em relação a Cristo, João escreveu: "nós
ouvimos, vimos, contemplamos, nossas mãos tocaram..." (I Jo.1.1-3). Ou
seja, o apóstolo estava afirmando insistentemente que o corpo de Cristo
era matéria, pois poderia ser tocado, como de fato o foi. Não se tratava
de um espírito, uma aparição, como os gnósticos afirmavam. (I Jo.4.2;
5.6)
OUTRAS PALAVRAS, EXPRESSÕES E
CONCEITOS EM DESTAQUE
VIDA - 1.1,2; 2.16,25;
3.14,15,16; 5.11,12,13,16,20
Vida de Deus para nós por meio de Cristo.
MUNDO - nosso
posicionamento: não amamos o mundo; somos odiados por ele; haveremos de
vencê-lo (I Jo.2.2,15,16,17; 3.1,13,17; 4.1,3,4,5,9,14,17; 5.4,5,19).
VERDADEIRO - Mandamento –
2.8. Luz – 2.8. Unção – 2.27. Jesus – 5.20. Deus – 5.20.
AMOR ( e verbo amar)
2.5,10,12,15; 3.1,10,14,16 (x Jo.3.16). 3.17,18,23;
4.7,8,9,10,11,12,16,17,18,19,20,21; 5.1,2,3. (Obs. II Jo.1,3,6 III Jo.1,6,7
Apc.2.3,4,19; 3.9,19). São da autoria de João alguns dos mais famosos
versículos bíblicos sobre o amor: "Deus é amor" e "Porque Deus amou o
mundo de tal maneira..."
Na primeira epístola, o autor usa o verbo amar em diversas conjugações:
ama, ameis, amamos, amemo-nos, amado, amados, amou, amar-nos, amo, amar,
ame, amemos.
O amor vem de Deus, através de Jesus. "Ele nos amou primeiro". Daí em
diante, o amor deve ter livre curso em direção aos irmãos, mas não em
direção ao mundo. O amor deve "circular como sangue" no Corpo de Cristo,
que é a igreja.
COMUNHÃO - 1.3,6,7.
MANDAMENTO(s) - 2.3,4,7,8;
3.22,23,24; 4.21; 5.2,3.
O QUE SE DIZ E O QUE SE É
- 1.6,8,10; 2.4,6,9; 4.20;
MANDAMENTOS NEGATIVOS
NÃO AMEIS o mundo - 2.15.
NÃO CREIAIS a todo espírito
– 4.1.
O amor e a fé só são positivos quando bem direcionados.
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